Dados do Processo

Processo: RR - 196300-60.2006.5.18.0013.
Fase Atual: E-ED.


Embargante: Norsegel Vigilância e Transporte de Valores Ltda.
Embargados: Ana RIta de Paula Coelho e Outros.


Egrégio Tribunal Superior do Trabalho.

Colenda Subseção I da Seção Especializada em Dissídios Individuais.

Ilustre Ministro Relator.

13 - Do Direito: o improvimento dos embargos, acaso conhecidos.

Na eventualidade de seu ultrapassar a visível inadequação absoluta dos embargos e no caso de se reputarem contornáveis os vários obstáculos à admissibilidade do recurso (quanto a cada um de seus temas), de se dizer, então, que os embargos não merecem provimento.

Quanto ao tema "prescrição", há vários precendentes do STF no sentido de que inexiste violação à CF na aplicação de prazo prescricional cível em ações de acidente de trabalho ajuizadas antes da EC nº 45. Veja-se, como exemplo, o seguinte acórdão:
"RECURSO. Extraordinário. Prequestionamento no extraordinário. Caracterização. Agravo conhecido. Deve ser conhecido agravo, quando prequestionada a matéria constitucional, sem que isso implique consistência do recurso extraordinário. 2. RECURSO. Extraordinário. Competência. Justiça do Trabalho. Decisão mantida. Prescrição. Violação ao art. 7º, XXIX, da Constituição Federal. Inexistência. Matéria infraconstitucional. Aplicação do Código Civil Brasileiro. Agravo regimental não provido. Não cabe recurso extraordinário que teria por objeto alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, de inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República.” (RE 536262 AgR, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Segunda Turma, julgado em 15/04/2008, DJe-083 DIVULG 08-05-2008 PUBLIC 09-05-2008 EMENT VOL-02318-05 PP-00976 LEXSTF v. 30, n. 359, 2008, p. 292-295).

E do voto do relator constou:
"O deslocamento per si da competência para a Justiça do Trabalho não desvirtua a natureza jurídica das ações acidentárias, fundadas em direito comum, pois a pretensão indenizatória continua sendo de caráter tipicamente pessoal. À luz desse critério distintivo, não há falar em ofensa ao disposto no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, pois trata-se de matéria de cunho infraconstitucional. E isso fica evidente ao simples exame do decisum impugnado, onde se lê: '(...) A presente pretensão indenizatória tem base no direito comum, sendo de caráter tipicamente pessoal. Aplicação da regra do art. 177 do Código Civil de 1916, que prevê praso de 20 anos para a ocorrência da prescrição” (fl. 294v).'"

No caso em tela, deve-se lembrar que o ato ilícito que se busca reparar aconteceu em abril de 1984.

Primeira pergunta: em abril de 1984, época do ilícito, ¿vigia o artigo 7º da Constituição Federal de 1988?

É evidente que não (!!!): a Constituição de 1988 somente entrou em vigor em 1988...

Então, ¿quais os diplomas vigentes à época?

Na época do ilícito, 1984, vigiam (1) a Constituição de 1967 (com as todas as suas emendas, mormente as Emendas Constitucionais de 1969) e (2) o Código Civil de 1916.

O primeiro diploma legal (mais especificamente constitucional) estabelecia a competência da Justiça Estadual Comum para processar e julgar ações como a de que se trata, julgamento esse que deveria se dar por meio da aplicação do direito comum então vigente, qual seja, o Código Civil de 1916. 

Confira-se o conteúdo do § 2º do artigo 142 da Constituição Federal de 1967:
Art. 142. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei, outras controvérsias oriundas de relação de trabalho.
...
§ 2º Os litígios relativos a acidentes do trabalho são da competência da justiça ordinária dos Estados, do Distrito Federal ou dos Territórios.

Fixada a competência, à época, da Justiça Estadual comum, veja-se então que, quanto á questão prescricional, o Código Civil de 1916 (então vigente) não estabelecia prazo prescricional específico para a ação de que se trata, razão pela qual incidia a regra prescricional comum para ações pessoais: (art. 177) prazo de 20 anos.

Então diga-se com todas as letras: em 1984, data do ato ilícito, começou a correr o prazo prescricional dos ora Embargados, prazo esse de 20 anos (e que portanto se esgotaria apenas em 2004).

Pois bem; ainda não prescrita a ação indenizatória, em 1988 entrou em vigor a atual Constituição Federal, e seus artigos 109 e 114 - tais quais historicamente interpretados pelo Supremo Tribunal Federal - mantiveram a competência da Justiça Comum para julgar ações como a presente.

Por esse motivo, no ano de 2000, tendo em vista (1) o prazo vintenário do direito comum ainda não vencido e (2) a competência da Justiça Estadual, os ora Embargados ingressaram com a presente Ação de Indenização perante a Justiça Comum do Estado de Goiás.

A pergunta então é: em 2000, data do ajuizamento da presente ação, ¿havia prescrição?

Ora, é claro que não (!!!). Em 2000, a competência para julgar a presente ação era da Justiça Comum e vigorava o Código Civil de 1916, o qual estabelecia a prescrição vintenária. Se assim é, como não haviam se passado 20 anos do ato ilícito, não estava prescrita a ação quando de seu ajuizamento, no ano de 2000.

Pois então: posteriormente ao ajuizamento da presente ação (e já em 2003) entrou em vigor o novo Código Civil, alterando prazos prescricionais, mas é evidente que - in casu – não poderia ser o novo Código Civil aplicado para fins prescricionais já que a ação de que se trata já havia sido proposta quando de sua entrada em vigor (!!!).

Pois bem; somente em 2004, com a Emenda Constitucional n° 45, foi alterada a competência para o julgamento de ações como a presente, tornando-se competente a Justiça do Trabalho, mas nessa época a presente ação já havia sido proposta fazia muito tempo.

Dessa forma, para se afastar a alegação de prescrição, basta que se faça a pergunta anteriormente formulada: em 2000, data do ajuizamento da presente ação, ¿havia se dado prescrição?

Evidente que não, pois em 2000 a competência para julgar a presente ação era da Justiça Comum e vigorava o Código Civil de 1916, o qual estabelecia a prescrição em 20 anos, razão pela qual não estava prescrita a presente ação quando foi ela proposta perante a Justiça Estadual, então competente. 

Por esse motivo, absurdo o raciocínio jurídico da Embargante: de acordo com sua tese, com a entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 45/04, quando a presente ação já havia sido proposta, o prazo prescricional teria sido diminuído retroativamente para três anos, prescrevendo a pretensão dos Embargados em 1987, quando nem a EC nº 45 nem a própria CF/88 estavam em vigor (!!!).

Isso, Julgador, não é apenas absurdo, é sobretudo pueril, pois o raciocínio da Embargante tem a seguinte (injurídica e ilógica) conclusão: em 2004, com a entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 45, o prazo prescricional da presente ação teria retroagido para 1987 (!!!), mas em 1987 não vigorava sequer a Constituição de 1988, que segundo a Embargante teria sido violada (!!!).

E se assim é, quando do ajuizamento da presente ação (em 2000) ela evidentemente não estava prescrita.

O raciocínio é simples. Prescrição é questão de direito material. Na data do ilícito começou a correr o prazo prescricional vigente na época. Em 1984, vigia o Código Civil de 1916, que estabelecia prazo prescricional de 20 anos. Então de 1984 a 2004 não estaria prescrita a pretensão dos aqui Embargados.

Em 1988 entrou em vigor a Constituição de 1988, mas ela não alterou a competência para o julgamento de ações de indenização por acidente de trabalho.

Em 1989 tampouco foi a competência alterada.

Em 2000, tampouco foi ela alterada.

Em 2000, foi proposta a presente ação.

Em 2000, o prazo prescricional era vintenário e a Justiça Estadual era competente para julgar ação de indenização por acidente de trabalho; e nesse ano, em 2000, foi proposta a presente ação, ação essa que foi proposta perante a Justiça competente e antes da ocorrência da prescrição.

Os dispositivos que entraram em vigor depois disso (sobretudo a EC n° 45), não podem retroagir, pois o artigo 5º da Constituição Federal veda o efeito retroativo a normas jurídicas.

Vê-se então que andou bem a origem em não reconhecer a suposta ocorrência de prescrição. Daí , portanto, o acerto da jurisprudência deste TST quanto ao tema:

"O c. TST firmou entendimento de que se aplicam os prazos prescricionais previstos na legislação civil às ações de dano moral e material decorrentes da relação de trabalho ajuizadas antes da Emenda Constitucional 45/2004. Na hipótese em exame, o TRT noticia que o acidente de trabalho ocorreu em 26/04/1984, enquanto a ação fora ajuizada em 10/02/2000. Ambos os eventos ocorreram antes da EC 45/04 e na vigência do Código Civil de 1916, que previa o prazo prescricional de vinte anos para as ações de indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho. Logo, não há prescrição a ser declarada."

Quanto ao tema "valor dos danos morais", repita-se apenas o que ficou já assentado como substrato fático na origem:


"Primeiramente é preciso frisar que houve sim culpa da segunda Requerida [da ora Embargante] na morte do de cujus, pois não é possível conceber que tamanho desequilíbrio não fosse sentido por uma avaliação psicológica mais apurada.
Esse desequilíbrio só foi sentido tardiamente através do relatório de fls. 123/125, elaborado pelo diretor de segurança da empresa Norsegel, que concluiu que 'Tudo leva a crer que JOSÉ ERIVALDO DA SILVA é um psicopata', porquanto inexiste 'motivação para a absurda violência com que o crime foi praticado'. Ao contrário do que consta do apelo patronal, o aludido relatório foi produzido por quem detinha poderes de representação da Norsegel e constitui prova hábil a ser usada em desfavor da empresa.
Ainda segundo tal relatório, um incidente que só veio à tona após o crime e que foi relatado pelo ex-patrão de'Ceará', Sr. Caleb, ratifica o entendimento. E prossegue:
Segundo o Sr. Caleb, após ligeira discussão entre José Erivaldo da Silva e um seu colega de serviço, aquele o agrediu com uma faca só não o matando graças a interferência de circunstantes. Mais tarde 'Ceará' sofreu uma crise em que sua respiração alterou, permanecendo por algum tempo inconsciente e espumando pela boca. Quando voltou a si, declarou que isso acontecia 'sempre' que era impedido de se vingar de alguém' Obviamente, foi despedido do emprego. Outras notícias não confirmadas dão conta da desproporcionalidade de suas reações ao ser censurado por alguém.
Assim sendo, entendemos ter havido falha no recrutamento do vigilante José Erivaldo da Silva. Ainda que sua contratação tenha sido feita por indicação do sub-gerente da Agência de Redenção do Banco do Brasil, Sr. Valter Domingos do Amaral, uma pesquisa em seus últimos empregos teria demonstrado sua inadequação para o cargo.
Logo, a própria empresa Norsegel, através de seu diretor, reconheceu a culpa ao admitir que 'uma pesquisa em seus últimos empregos teria demonstrado sua inadequação para o cargo'.
Ainda que assim não fosse, a Reclamada teria que realizar acompanhamentos psicológicos durante toda a vida laborativa de seus vigilantes, além de treinamentos, já que a profissão é muito estressante, por implicar em risco de vida, inclusive de terceiros.
A entrega de uma arma de fogo a um vigilante pressupõe que houve rigorosa análise psicológica, além de um exaustivo treinamento e investigação de seus antecedentes, o que não foi feito, revelando descaso patronal na contratação.
...
A indenização fixada a título de dano moral deve levar em conta duas finalidades: punir o infrator e compensar a vítima, em valor razoável, o suficiente para que se reprima o ato lesivo, sem ser um valor inócuo ou que propicie enriquecimento sem causa.
Esta Corte, em recentes decisões, vem admitindo sua interferência na valoração do dano moral, mesmo demandando intromissão do magistrado no campo fático da controvérsia, com o objetivo de adequar a decisão a parâmetros razoáveis, o que me leva a admitir que o TST deva, a princípio, exercer um controle sobre o quantum fixado nas instâncias ordinárias, em atenção ao princípio da proporcionalidade previsto no artigo 5º, V, da CF/88.
...
Em verdade, não há como reparar o sofrimento pela perda de um ente querido, no caso, um chefe de família, que deixara dois filhos e uma viúva à deriva. Nesse esteio, a indenização servirá, apenas, para amenizar o sofrimento da viúva e dos filhos.
...
De fato, não há como menosprezar o sofrimento prematuro da viúva e de seus filhos menores, que de inopino, perderam aquele ente que sustentava a família."

Vê-se então que o valor em que fixados os danos morais não foram exagerados, tendo em vista os fatos da causa, razão pela qual não deve ser minorados.

Quanto ao tema "multa", saliente-se apenas que a Embargante, ao interpor os presentes embargos (grosseiramente inadequados e inadmissíveis), volta a protelar o feito, e assim reforça a necessidade da multa que agora tenta - por meios inadequados - expungir.